PAULINHO BOLA NA TRAVE
Beirando os setenta e nove anos, o Paulinho. E nem por isso tomando jeito. Paulinho Bola na Trave, nomeou o sebista, enquanto riam os colegas, sádicos, diante das presepadas de Paulinho. Alguns se apiedavam. Será carência? Será solidão? Senilidade ou serenojovialidade? Sem-vergonhice mesmo.
– Será?
Quando chegava, muito distinto. Houvesse mulher presente na roda, começava logo com os galanteios, se utilizando de umas três ou quatro rimas de perna quebrada. E, ao findar a primeira dose da indefectível cana Pitu, prometia mundos e fundos caso a dama o aceitasse como digníssimo senhor seu marido.
– Aceito tudo – babava.
A partir da terceira dose, fechava-se mais e mais nos seus delírios, enquanto no bar ninguém dava por sua existência. Às vezes dava sinal de vida, arregalando os olhos e soltando súbitas exclamações:
– Não parta, Auta!
– Ei, Wanderley!
Paulinho, Paulinho... Aposentado, morava sozinho numa casa de dois andares. Nem papagaio nem jarro de Comigo-ninguém-pode para o acompanhar. Como seriam os domingos de Paulinho? Que pesadelos teria em certas madrugadas? Quem cozinhava para ele e engomava suas calças, sempre impecáveis? Quais seus livros prediletos?
Pois Paulinho se revoltou com o desprezo que na mesa lhe davam. Primeiro jogou o copo no chão espatifando-o em mil cacos.
– Paulinho, corta essa – dizia cada um, logo retomando o fio da conversa animada. Depois levantou-se, impondo silêncio.
– Oh!
Sacou do pau e mijou sobre os pratos vazios e copos descuidados.
– Porra, Paulinho!
Foram saindo, devagar, para outras mesas e companhias. Paulinho ficou só. Enquanto a garçonete limpava a sujeira, maldizia Paulinho:
– Quero ver rasgar dinheiro! Vai, rasga!
A resposta, um sorriso largo e alucinado.
A tarde chegava e ninguém mais se lembrava de Paulinho. Até porque aquilo não era novidade: mijou também em assembléia de sindicato. Além disso, Paulinho já jogou dinheiro na Rio Branco, já amanheceu nu na calçada, já nadou sem roupa em piscina de clube... Paulinho Bola-na-Trave. Quando caía a noite, reparavam que Paulinho sumira, enfim. Foi-se embora, depois de gritar uma centena de vezes para as mulheres que passavam pela rua em frente:
– Quero teu cu!
E a promessa de sempre:
– Aceito tudo!
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