ODE AO BAR E AO LUAR
Ao bar,
Venho sempre.
Venho assim:
Lua cheia,
Venho plena,
Eu cheia de mim.
Lua míngua
E eu, cínica,
Rio de mim.
Lua nova
Eu me escondo
Eu escombro
De mim.
Lua cresce
E eu, criança
Que tece
Esperança de mim.
Ao bar,
Venho sempre.
Sozinha, com a lua
Dia não, dia sim.
quarta-feira, 28 de setembro de 2011
segunda-feira, 19 de setembro de 2011
MAIS UM CONTINHO ORDINÁRIO
NOS DILEMAS DOMINGUEIROS
Da varanda de seu apartamento de um oitavo andar no bairro do Tirol, observava lá embaixo a vida no movimento de um domingo de sol no clube vizinho.
Quantas cores e sons não aconteciam naquele momento? E ninguém lá, entre velhos poetas, maridos manicacas, mulheres de celulite e crianças estragadas, poderia imaginar sua existência.
E, no entanto, ele existia.
Estava ali, no dilema de escolher entre ler pela décima terceira vez o “Antilogia Poética Potiguar” ou pegar em cima do guarda-roupa a pistola 45 e dar um tiro certeiro no peito, tal como fez Osvaldo Lamartine. Na dúvida, foi a te a varanda, (quem sabe, pela última vez?) para ver o noivo da cidade.
Quanto sol, quanta luz! Como não aceitar a vida, do jeito que ela é?
Perdia-se, assim, nessas divagações todas suas quando, lá embaixo no clube, percebeu a cena.
O verde do gramado do parque infantil fez destacar os dois, isolados perto do muro, homem e menino, um de frente para o outro. A princípio, pensou tratar-se de um pai em considerações com o filho. Algo de constrangido na postura da criança parecia indicar para ele que o menino levava um pito, decerto por algumas dessas chateações que sempre causam esses pequenos cães.
Mas de repente viu o homem olhar para os lados, ajoelhar-se e puxar o menino para junto de si. Com uma mão prendia o pequeno corpo pelas costas e com a outra mão nervosa afagava as partes íntimas da criança.
Tudo não durou mais que alguns segundos. Logo o homem largou o menino e cada um seguiu, sem correr, para uma direção, indo em lados opostos.
Ficou ainda um instante na varanda, aguardando não se sabe o que, sentindo na pele o calor do sol de domingo. Olhou mais uma vez o céu e entrou, fechando atrás de si a porta de vidro. Atravessou a ampla sala, dirigindo-se à cozinha. Decidiu fazer um café bem forte.
Nada melhor para acompanhar a leitura de poemas da geração alternativa norte-rio-grandense.
domingo, 18 de setembro de 2011
MAIS UM POEMINHA ORDINÁRIO
VIAGEM
O capim
é elefante,
na estrada, o carro
sempre adiante
como sonho que sou
errante.
O capim
é elefante,
na estrada, o carro
sempre adiante
como sonho que sou
errante.
quarta-feira, 14 de setembro de 2011
POETAS POTIGUARES: JORGE FERNANDES
PRECES À LUA
Oh! lua branca de Antônio Nobre,
Boiando triste num céu de estio...
O teu clarão que os ermos cobre
Faz tudo morto, faz tudo frio!
"Monja do espaço" de Cruz e Souza,
Vagando erma pela amplidão...
Velas contrita alguma lousa
De quem repousa na solidão?
Lua dos loucos, rugindo fúrias!
Lua dos ébrios, nas serenatas!
Lembras mistérios, tristes luxúrias
Dos feiticeiros nas grandes matas!
Lua dos loucos, dos delirantes,
Que gritam a esmo seus infortúnios...
Meio escondida nos seus minguantes
Doce redoma nos plenilúnios!
Leva-me um dia transpondo céus
Pra onde foram todos os meus!
(In: Livro de Poemas)
segunda-feira, 12 de setembro de 2011
MAIS UM POEMINHA ORDINÁRIO
(Para ArtLima)
VERSOS NOS CHAMAM,
AQUI ESTAMOS, PALAVRAS!
EM CORPO, ALMA
EM CHAMA.
COPOS NOS CLAMAM,
AQUI ESTAMOS, RESSACAS!
EM MIJO E SEDE,
INSANOS.
VERSOS NOS CHAMAM,
AQUI ESTAMOS, PALAVRAS!
EM CORPO, ALMA
EM CHAMA.
COPOS NOS CLAMAM,
AQUI ESTAMOS, RESSACAS!
EM MIJO E SEDE,
INSANOS.
sexta-feira, 9 de setembro de 2011
MAIS UM CONTINHO ORDINÁRIO
MEU ENCONTRO COM DOSTOIÉVSKI
ENTÃO, subitamente, vi-me ali: entre mãos leprosas e risos engasgados, entre cheiro de bosta e aroma de leite quente, entre carícias de veludo e unhas de gatos com rancor, ali estava. E em dezessete dias morreria. Morria, sim, sabia. A cigana de olhos vazados e dentes quebrados me disse, enquanto o anão puxava a ponta de meu vestido e suplicava por cochichar segredos indizíveis. Dezessete dias, minha santa, anunciou.
ENTÃO, já longe de toda aquela algazarra, distante de todo aquele burburinho, só havia o mar. O mar e a noite. O mar na noite. A noite do mar.
– É assim... – ele disse. Fez pausa e prosseguiu:
– Viver, às vezes, é tão bom que dá vontade de morrer.
E só olhava para os próprios passos na areia da praia, lentos, precisos. Seu semblante era sereno. Como se toda a Nona Sinfonia de Beethoven fosse inútil. Como se quarenta graus negativos fossem bobagem. Nada se comparava à solidão humana. Por essa aprendizagem, quis beijar sua cabeça calva, cheirar sua barba, tentar uma carícia impossível e sentir todo ele, ele... Tão polifônico, ele... Fiquei quieta, percebendo o mofo de sua casaca, o pó do tempo sobre seus bigodes... Fiquei quieta, e só o mar falou, as ondas na praia, nenhuma certeza além daquela – nada de coisa nenhuma pode durar.
ENTÃO, voltaram os dedos leprosos, as latrinas e leiteiras, o anão safado buscando em outras saias outras possibilidades, o riso perpétuo a fazer rostos se contorcerem de tanto chorar. Um gato se lambendo, candidamente. Almofadas cor de vinho para um sono eterno. Dezessete dias, minha santa, soprou a cigana, cruzando novamente meu caminho, com um sorrisinho quase meigo. Mas isso eu já sabia. E soube também, na areia da praia de uma noite enfeitiçada e sem lua no céu: nada pode durar.
DEPOIS, trouxeram mais comprimidos e compressas. Mas a febre não baixou.
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