terça-feira, 10 de dezembro de 2013

JUVENAL ANTUNES, UM POETA INOLVIDÁVEL!!!

DESCOBRI O POETA JUVENAL ANTUNES (CEARÁ-MIRIN, 1883-MANAUS, 1941) MEIO CASUALMENTE, NUMA CONVERSA DE SEBO, POR MEIO DO LIVRO DE ESMERALDO SIQUEIRA, "UM BOÊMIO INOLVIDÁVEL". É A PAIXÃO DA VEZ.
UM TEXTO DELE PARA EMBALAR A ALMA:






CONSELHOS SOBRE COMO SE VIVER A VIDA ( EM CARTA AO SOBRINHO VICENTE):
"Vicente
Tua carta está de molde a gerar suspeitas sobre teu futuro. Podes mesmo acabar como Rui Barbosa ou Lampião. Tens boa dose de mau sangue: do padre Antunes, do tio Soares, de Ana Bênder e de mim. Zombarás da humanidade, que te respeitará com medo de tua independência intelectual. Agora, que vais viver no Rio de Janeiro, dou-te em troca dos teus versos o seguinte decálogo, para te governares na vida:
I) Nunca te cases, nem memso com uma agonizante rica.
II) Não furtes pouco, que é muito feio.
III) Adora tuas produções artísticas, embora não valham nada.
IV) Foge das crianças, masculinas ou femininas. Elas em geral são crisálidas de borboletas venenosas (...)
V)Ama os vícios. Só têm o defeito de custar dinheiro. Quando este é muito, aqueles ficam doirados.
VI) Não mates nunca, não por amor à espécie humana, medo do inferno ou respeito às leis, mas porque isso é inútil. Matas um malvado, nascem dois.
VII)Sê bacharel, vagabundo, médico, parteiro, negociante ou coisa pior. Mas não sejas tolo.
VIII) Ama o dinheiro. Faze como o imperador Vespasiano que achava cheirosas as moedas recebidas do imposto das sentinas.
IX) Não queiras saber da mulher do próximo nem do distante. Não vale a pena. (...)
X) Só trabalhes quando te pagarem. De graça não faças nem uma graça.
Eis aí, meu caro sobrinho, o regime de vida que te aconselho. Lembro-te, porém, que é preciso algum talento e muita coragem para praticar este programa.
Desejo que sejas feliz na companhia do nosso parente militar. Estarás em bom quartel."


quarta-feira, 14 de agosto de 2013

MAIS UM CONTINHO ORDINÁRIO

UMA ESTRANHA NA CIDADE

Recém-chegada à cidade, no hotel, quando saiu para o almoço do primeiro fim de semana, deu com o que parecia ser um time de jogadores de futebol. Todos atletas, cheios de vitalidade. Passou por um que parecia ser o técnico ou qualquer merda equivalente. Falava ao telefone, mas interrompeu o que dizia para dar a ela um boa tarde cheio de malícia. Em questão de frações de segundo, ela então lembrou ter ouvido, enquanto dormia, um dos miseráveis carros de som que às sete da manhã já rodavam pela cidade anunciar um jogo no estádio local. Sem pensar, retrucou para o tal técnico:
– Não é por nada não, mas vocês vão perder...
A vida é pura ficção. A certeza mais certa que tinha consigo nos seus poucos 30 anos de vida... Console-se, minha cara: talvez tenha mais três décadas aí para você se afundar...
Tudo bem. Só lhe restava, por enquanto, passar protetor solar no rosto e se embriagar. Além de observar os urubus no céu. Ainda bem que trouxera Bukowski para se distrair... Ainda bem que acreditava no deus Devir...
Numa noite, numa outra dessas infinitas cidades com suas noites perdidas de sertão, depois da aula, ela foi beber uma cerveja no bar da Mercedes. Estavam lá as duas, bebendo a cerveja e pensando na morte daquele cantor clássico da música brega brasileira. O cara tinha emoção, não se podia negar, mesmo que fosse um cachorro. Subitamente, caiu uma chuva ali, naquele fim de mundo, que trouxera consigo um cheiro doce de caju. Foi ali que percebeu, de fato, com o peso de uma verdade inegável, que o tempo leva a todos, da capital ou do interior, para o mesmo e sempre fim.
E ela nunca seria capaz de esquecer isso.
Aliás, ali também havia uma funerária, já percebera. A funerária PAF. Todo dia, invariavelmente, um carro de som (mais um) rodava por aí anunciando a morte do prestimoso senhor de tal ou da inesquecível senhora fulana... Fazia parte dos serviços da Funerária PAF. É isso aí. Ele (ou ela) estava lá, cheiinho (ou cheiinha) de vida, quando de repente: PAF!
Cumpriu sua missão. E foi para debaixo da terra. Virar fóssil ou estrume de vaca. Ou nem isso.
Quando ela voltou para o hotel, o técnico falava com os seus jogadores, todos reunidos no restaurante, sem nenhuma vitalidade.
Devem ter perdido no jogo

quarta-feira, 31 de julho de 2013

ALGUMAS NOTAS: DESCABIDAS, PRETENCIOSAS

FABULAZINHA ORDINÁRIA
Era uma roseirinha miúda, dessas que florescem em várias cores. Mas até florescer, o jardineiro que a trouxe teve que suar. Muito cuidado e apuro, atenção e palavras doces todos os dias. E troca a água. E troca a terra. A princípio, parecia que ela não ia vingar, trazida de feira distante, amarrotada em solavancos de viagem, todo aquele terror da mudança de vasos e ares.
Mas viveu. E o jardineiro, herói vencedor que afirma a vida, rejubilou-se. Foi em uma manhã, em que se percebendo maior, notou a roseira, mesmo que miúda, vivente, e assim vivente, vencida. Ele domou a morte e a pequena roseira brava então viveu. Viveu sim.
Mas eis aí o começo do fim. O movimento que não cessa, enfim.
O jardineiro, longe do desafio de torná-la rosa mais viçosa, foi como que se apodrecendo aos poucos, inteiro por fim. Envergado, feio e murcho, foi desanimando até virar galho seco. A água vinha com menos frequência. Com menos carinho a palavra para saudar o sol. Adeus, rosa bravia, parecia dizer a cada dia.
Até que num suspiro de tédio e saudade, a roseirinha tomou da decisão: na primeira brisa da primeira tarde de setembro, despetalou-se, a roseira se despetalou e virou vento. E ficou sendo só lembrança de felicidade.

DRAMAS DO TEMPO PRESENTE:
O que fazer quando se está sozinho em casa e não se consegue abrir a garrafa de vinho de jeito maneira?
a-) Se contentar com a única latinha de cerveja da geladeira
b-) Pular da janela
c-) Ir escrever qualquer tolice no facebook e (ver outras tb)

MAIS UMA DE AMOR? ORA, FAÇA-ME O FAVOR!
Você que, afinal de contas freudianas, só pensa mesmo é em pau, cu e buceta: a vida não se resume a isso, será preciso gritar? quantos buracos maiores no mundo? E cadê o abismo mais digno por onde se atirar?
Hein? Fala, Odete!

EGO- MÃE:
Entre o querer-ser o próprio ID e o dever-ser o SUPEREGO da filha

quinta-feira, 27 de junho de 2013

70 ANOS DE FALVES SILVA: A VIDA COMO OBRA DE ARTE - por Cellina Muniz

Neste ano de 2013, o poeta visual Falves Silva completa 70 anos de traquinagens. As comemorações (cujo auge será em outubro, com exposição na Capitania das Artes), já começaram, com o lançamento, no dia 15 de junho, da Pindaíba, revista independente de Fortaleza que traz matéria sobre esse expoente do Poema/Processo e da Arte Postal. Na ocasião do lançamento, Falves também apresentou a exposição “Cápsulas da Memória”, com trabalhos em ilustração e colagens reverenciando nomes diversos da cultura local e internacional e que, de algum modo, atravessaram sua trajetória.
Há vários motivos pelos quais eu me sinto fã do trabalho e da pessoa desse Mister Boy: desde as agruras que marcaram sua infância (pelo que foi obrigado a migrar da Paraíba para terras potiguares e trabalhar logo muito cedo, exercendo atividades múltiplas, como carregador de baldes d´água, entregador de jornal e ajudante de sacristão), passando pelo seu autodidatismo (com suas livres leituras no campo dos quadrinhos, cinema e semiótica) e pela sua presença fundamental na idealização e composição de jornais da imprensa alternativa da cidade de Natal (como A Franga, Cebola faz Chorar, Jornalzinho do Sebo Vermelho, A Margem) até chegar à sua habilidade inventiva em matéria de tiradas cômicas e satíricas. Mas um dos motivos que me chamam atenção e que destaco neste texto diz respeito à condição de Falves Silva de sujeito da experiência, nas palavras do educador espanho Jorge Larrosa, ou, mais precisamente ainda, seguindo a perspectiva do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, de ser/estar no mundo como obra de arte.
Comento isso um pouco mais a partir de dois trabalhos de Falves, ambos colagens: um, apresentado no zine Bichiga Taboca, de dezembro de 2002, e outro, apresentado na referida exposição “Cápsulas da Memória”, realizada lá nas adjacências do Beco da Lama, tradicional reduto boêmio e artístico da cidade.




Geralmente, uma colagem pode se definir como a apropriação/intervenção sobre imagens e textos de origens diversas, ressignificados e abertos à “versão” do espectador. Nesse trabalho, em meio a uma avalanche de letras de distintas fontes e uma série de ícones (do cinema, da música, das artes plásticas), lá está o rosto de Falves Silva, como a querer dizer: também eu faço parte dessa fauna, também eu posso narrar, num transbordamento de linguagens, a minha existência. Eu, sujeito assim exposto e imposto, fruto de uma experiência criativa/interpretativa que não cessa nunca. Eu, paixão. Paixão sim, já que “se a experiência é o que nos acontece e se o sujeito da experiência é um território de passagem, então a experiência é uma paixão” (LARROSA, 2004, p. 163).

Nessa narrativa de si de sujeito passional, nenhum problema em nivelar-se a Beethoven ou Che Guevara e nem cabe julgar isso com olhar moralizante. Como diria Nietzsche, ao Diabo com a moral! (NIETZSCHE, 2006, p. 77). O que vale, em uma concepção dionisíaca de arte, é a “vontade de vida”, “o triunfante Sim à vida” (NIETZSCHE, 2006, p. 105).
A mesma vida que se afirma no excesso, na força, na plenipotência da mistura de linguagens. Porque se a linguagem nunca dará conta do real, é preciso abusar dela, fazê-la transbordar além de seus limites. Assim, não seria o Nadaism esse vácuo em que pode caber o tudo, não só seus prazeres e seus pavores mas sobretudo a reinvenção do eu pela própria arte, única maneira de escapar à morte?
Quanto mais vejo os trabalhos de Falves Silva, mais admiro sua condição de sujeito passional e de artista dionisíaco, aquele que já se delineava quando, moleque ainda, costumava agradar aos papudinhos da vizinhança por cantarolar Jackson do Pandeiro. Sinto-me feliz por tê-lo conhecido e poder ouvir suas histórias enquanto tomamos juntos algumas cervejas pelos botecos da Cidade-Alta.
Um brinde à vitalidade de Falves Silva. Um brinde à vida!



REFERÊNCIAS
LARROSA, Jorge. “Linguagem e educação depois de Babel”. Tradução de Cynthia Farina. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
NIETZSCHE, Friedrich. “Crepúsculo dos ídolos”. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

LANÇAMENTO DA REVISTA PINDAÍBA EM NATAL-RN-2013

A Revista Pindaíba comemora 10 anos de existência com o lançamento de sua terceira edição na capital potiguar. Idealizada e realizada por um grupo de afinidades da cidade de Fortaleza, Ceará, a Pindaíba reatualiza a força das publicações independentes e a vontade de potência daqueles que querem se fazer expressar para além das regras do grande mercado e que, desde sempre na história dos impressos, dão um jeito para afirmar seu lugar ao sol!
Vida longa à Revista Pindaíba!
E um brinde à vida!

 O editor e a autora: André Dias e Cellina Muniz

 Manoel Carlos, editor da Revista Pindaíba, no seu momento poético

Falves Silva, o poeta/processo, comemorando seus 70 anos de arte com os pindaibeiros

domingo, 9 de junho de 2013

quarta-feira, 5 de junho de 2013

UM HAKAI PARA O DIA DE HOJE

AH!
O ROUXINOL
MESMO EM PRESENÇA DE UM PRÍNCIPE
SEU CANTO É O MESMO

(ISSA)

RIMAS CHINFRAS


MORRER É DIFÍCIL
RENDER-SE É MAIS.
NÃO,
NÃO HÁ PAZ.
E EU SIGO.

***

NÃO TINHA QUE SALVAR A ÁFRICA,
NÃO TINHA QUE ENTENDER DE TUDO...
MAS SUA ALMA, MESMO RALA,
ERA DO TAMANHO DO MUNDO.

***

SE TUDO ACABA
POR QUE A DOR?
SE TUDO FIM
POR QUE O AMOR?


terça-feira, 4 de junho de 2013

UMA CARETA PARA OS CARETAS





Eles/Elas dizem: você não devia ter feito isso, você deve fazer assado... Tod@s têm sempre uma opinião formada sobre tudo, tod@s sabem sempre a fórmula exata.
Hoje esta postagem, tola mas sincera, vai como careta para os caretas muito nobres em suas certezas, muito certos em sua nobreza. Eu prefiro a honestidade dos que rolam abismo abaixo sem o peso das convenções e ao calor de suas paixões. Tolas, mas sinceras.

terça-feira, 14 de maio de 2013

sábado, 11 de maio de 2013

RIMAS CHINFRAS


Não há verso
no inverso
em que volta e meia
me converto.
Eu, tão sem nexo,
Eu, tão lua cheia,
aquela que contempla
o pescador perverso
afogar-se na areia.

A VOLTA DE ALICE N.


Depois de um chá de sumiço, quando eu menos esperava, eis que ela simplesmente me aparece, o sorriso mais sonso na cara. Alice N. voltou.
- Cheguei!
Tentei ignorar, como quem não dá a mínima por sua existência. Ela nem te ligo, largou as tralhas no meio da sala (uma bolsa colorida cheia de livros, papeis e algumas roupas) e foi se despindo para o banho. Não parava de tagarelar, só coisas desencontradas e sem nenhum controle.
- É assim mesmo, meu bem - falou, como quem consola - vida de rotinas e vida de aventuras, não foi assim que falou o teu mestre?
Acabei caindo no truque:
- Nietzsche?
Em resposta, ela deu uma gargalhada gostosa e foi para o banheiro. Uma sonsa aquela Alice N. Uma irresponsável, uma cínica, uma egoísta...
Suas palavras não me davam sossego. E sua presença, novamente materializada depois de tanta ausência, eram um misto de inquietação e alegria.
Enquanto eu me organizava para a lida do dia seguinte (seria Leminski? Talvez, mas não era muito o estilo dele...), ela cantarolva no chuveiro uma canção italiana, muito inocente. Pensei em fuçar suas coisas, saber o que andara escrevendo e aprontando.
- Alice N., por onde você andou? - eu quis saber, vendo os pingos escorrendo do corpo dela e ensopando o chão da casa.
- Por aí... E por aqui?
Aquela merda de sempre: a imprensa espremendo sangue das notícias, os egos inflados, as amizades frágeis que se vão...E, por certo, um próximo livro a ser lançado.
-Bukówski?
Em resposta ela me deu as costas e foi comer uma maçã. E eu fiquei ali, feito boba. O que se pode exigir de uma criatura dessas? O que se pode exigir da vida? Tudo? Todos os compromissos e promessas, fidelidade e dedicação?
Alice N. era como qualquer um: aquela contradição.
Observando a figurinha mastigando sua fruta muito candidamente, eu sentia minha respiração voltando ao normal. Quando minha revolta esfriou de vez, lembrei, num estalo:
-Maffesoli! Claro!
E a vida seguiu.

quarta-feira, 27 de março de 2013

POESIA PARA O DIA



AS FLORES
SÃO MESMO
UMAS INGRATAS

A GENTE AS COLHE
DEPOIS ELAS MORREM
SEM MAIS NEM MENOS
COMO SE ENTRE NÓS
NUNCA TIVESSE
HAVIDO VÊNUS

PAULO LEMINSKI

segunda-feira, 11 de março de 2013

MAIS UM CONTINHO ORDINÁRIO (DEDICADO À PATRÍCIA MELO)



ESCREVENDO NO ESCURO TAMBÉM
Largou o livro, numa expressão de enfado. Ô ódio! Vai escrever bem assim no inferno, sua maldita. Foi até a geladeira e pegou uma maçã, o estômago doía. Gastrite ou úlcera? O exame era na sexta. Na quinta tinha a panfletagem. Olhou para o fanzine no chão, ainda por terminar. Quero lá saber de poesia marginal agora. Quero lá saber de nada.
É que a lua estaria cheia dentro de algumas horas, sabia. É que seus hormônios infames a atacavam novamente, sabia também. E daí? É que não fazia outra coisa a não ser pensar na criatura. Dois anos naquela joça: ia dormir pensando na criatura, acordava pensando na criatura e quando sonhava, era a criatura o objeto de suas condensações e deslocamentos oníricos. Uma verdadeira praga. Ô ódio!
Cara Patrícia. Eu te adoro. Você escreve como ninguém. Adoro seus romances, adoro seus contos. Mas você não supera Clarice, queridinha. Isso não.
Por falar em Clarice, já que se há de escrever, que ao menos não se esmaguem com palavras as entrelinhas. Isso ela leu numa reportagem sobre as anotações de leitura de Ana Cristina. Outra louca atacada. Teria ela também gastrite?
Ou úlcera?
Quem, Clarice ou Ana Cristina?
A Patrícia...
É, Leminski, haja hoje para tanto ontem. Tinha ímpetos de pegar no telefone, ligar qualquer número ao acaso e perguntar para quem quer que atendesse:
- Alô?
- Me diga uma coisa, por gentileza: o que fazer com essa dor a me roer as entranhas, com essa obsessão a me triturar os nervos, com esses hormônios a me envenenarem o sangue e com essa lua a me revirar pelo avesso?
- Vai lavar uma louça, minha filha. Ou pegar no cabo de uma enxada, também tá valendo. Já viu as estatísticas de quantas crianças morrem por dia de inanição?
Tu, tu, tu...
Somente tu.
Olhou para a tela vazia do computador. Nada, totalmente no escuro.
Querida Patrícia. Seu conselho, de começar a escrever seja lá o que for não adiantou de nada. Continuo às cegas. Aliás, já te falei que te adoro? Mas não mais que Clarice, claro...
O estômago doía. No chão, o fanzine esperava por ser finalizado. Pegou novamente o livro, resignada. Logo mais a lua estaria no céu. E em uma semana estaria minguante.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

10 anos de PINDAÍBA!!!


A REVISTA PINDAÍBA, UMA PUBLICAÇÃO INDEPENDENTE, ATREVIDA, METIDA A BESTA E CHEIA DE VONTADE DE POTÊNCIA, GRAÇA E INDIGINAÇÃO, IDEALIZADA, INSPIRADA E VIVENCIADA POR UMA CERTA MARGINÁLIA DA CIDADE DE FORTALEZA, CAPITAL DA TERRA DE IRACEMA,  ESPECIALMENTE NO BAIRRO DO BENFICA, COMPLETA 10 ANOS EM SUA TERCEIRA EDIÇÃO. VIVA OS IMPRESSOS QUE DESORDENAM OUTRAS FORMAS DE SER E VIVER ARTE.
VIDA LONGA À PINDAÍBA E AOS PINDAIBEIR@S!

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

MAIS UM CONTINHO ORDINÁRIO


O DEDO DO PÉ
Tinham a mesma idade e eram do mesmo signo lunar. A diferença: uma patroa, outra empregada. Então, em certas manhãs, enquanto uma passava o pano no chão, a outra saía à toa para saborear sua contradição.
Ambas tinham uma filha, meninas também, com quase a mesma idade. A patroa (que boazinha que ela era...) permitia que a empregada (que sortuda que ela era...) levasse a filha para o trabalho.
Numa daquelas manhãs contraditórias, antes de sair, a patroa-mulher cismou com uma coisa. As duas meninas, enquanto comiam cereal com leite, divertiam-se com os trejeitos de um palhaço na TV. Soltavam gargalhadas sonoras naquela beleza que pode ser a infância, o que chamou a atenção dela, distraída no sofá com suas conjecturas. Olhou para as duas, observando a cena, quando percebeu. O dedo do pé.
Que dedo feio! Horrorizou-se em pensamento. Era o dedo mínimo, que, na criaturinha, parecia mais ínfimo ainda. O dedinho do pé direito, quase imperceptível, mostrou-se para ela estranhamente grotesco e monstruoso.
Um dedo. Um centímetro teria? Quantas léguas trilharia aquele dedinho de pé? Quais os caminhos desconhecidos para se trilhar, quais os labirintos a se percorrer?
Enquanto as meninas riam a valer, a mulher saiu, incomodada por demais com aquela presença. Um dedo do pé. Passou o dia fora, ocupada em distrações diversas, mas quando chegou em casa, no fim da tarde, não pôde se controlar e fixou-se de pronto no dito cujo, quase escondido na chinelinha gasta.
Foi tomar um banho, nauseada com aquela visão. Como é que não vira aquilo antes, depois de tanto tempo? Após a ducha, não quis jantar, ainda impressionada com o horror do dedinho. Rolou na cama por várias horas, sem conseguir dormir. E quando finalmente adormeceu, sonhou.
Assim era seu sonho.
Sonhou que seguia por uma praia deserta. Isso mesmo, de novo. Caminhava e parecia ser cedo, muito cedo, o sol mal saíra. Ia pela risca onde as ondas morriam na areia, quando, subitamente, surgiu à sua frente uma pequena caixa dourada e ornada, de puro ouro.
Ajoelhou-se e ao abrir a caixa, deparou-se com o dedo já arroxeado, decepado de seu corpo.
Enojada, correu e correu quando viu uma porta e correu em sua direção. Parou ofegante frente a ela, abriu e ao entrar deu com o espetáculo.
Pessoas diversas, todas estranhas, homens e mulheres, corriam desesperadas em todas as direções. Algumas caíam e eram pisoteadas e uma fumaça negra cobria rostos e vultos numa sombra de pavor.
Acordou assustada, já atrasada para os compromissos do dia. No trabalho foi que ouviu a notícia: um incêndio em uma casa de show em outra cidade matou mais de duzentas pessoas.
Foi um dia péssimo. Com olheiras, discutiu com um colega, derramou café na blusa branca, errou nas contas e não conseguiu achar em nenhuma das gavetas uns papeis de que precisou. E logo que chegou em casa, exausta, um rostinho feliz veio lhe saudar com aquela presença terrificante: o dedo mínimo do pé direito, ainda pavorosamente horrível.
Deus do céu, que asco! Trancou-se mal-humorada no quarto, mal falou com ninguém. E quando dormiu, outro sonho veio assombrar sua noite.
Dessa vez, saindo de um quarto fechado e escuro feito breu, deu de cara com uma praia cheia de cadáveres. Candidamente, ondas batiam nos corpos inertes que ocupava a praia às centenas, aos milhares. Entre os mortos, homens e mulheres todos nus, avistou, ao longe, novamente a mesma caixa de ouro reluzente.
Não foi trabalhar nesse dia. E saiu logo cedo, procurando não esbarrar com a visão ameaçadora. Auele dedo aterrorizava seu pensamento como prenúncio ameaçador do mal. Que seria aquilo? Que fantasma ou demônio funesto aquele a lhe espreitar?
Andou a esmo o dia todo, sem destino certo, distraída no sinal vermelho, esquecida entre vitrines e bancas de revista. E assim feito zumbi, viu a manchete a escorrer o sangue lucrativo: mais de três mil mortes com o tsunami no litoral de um outro país.
Ao acordar, suada, na alta madrugada, teve certeza: era o dedo. O incêndio, a onda gigante, era tudo culpa do dedo! Claro! Claro, claro, claro. E enquanto o dedo pisasse sobre a terra, mortes aconteceriam até que... até...
Não teve dúvida. Aquele dedo tinha que ser expurgado. Cortado, amputado, sangrado e dizimado. Precisava virar pó para fazer cessar a fúria da Mãe Terra. Era preciso desmaterializar aquele dedo do planeta para rematerializá-lo em algo outro. Outra coisa. Outra vida. Sim, porque o mundo é assim mesmo absurdo e tudo cabe e se explica no dedo mínimo do pé de uma criança.
Mas como fazer? O que sua empregada iria pensar? Jamais permitiria aquele gesto, evidentemente. Não aceitaria nunca, julgaria uma atrocidade, não perceberia a magnitude do ato brutal.
E, confusa, odiava a si mesma por nunca ter percebido, em todos aqueles anos, aquele dedo maléfico. Mas que atitude poderia ter tomado antes? Como iria saber? Não havia jeito, a solução era agir logo e de maneira mesmo trágica, quaisquer que fossem as consequências. É, mas como fazer?
Uma anestesia potente para fazer a menina dormir profundamente? Então o golpe rápido e fatal, dando fim ao dedo com o facão de carne da cozinha? Ah, o horror, o horror, gemia, miserável, imaginando já o rosto de censura e ódio da empregada-mulher.
Três dias depois, sem dormir e sem comer, obcecada com a ideia fixa – o espectro do dedo a lhe angustiar Após o almoço, numa tarde sonolenta, ordenou, voz decidida de patroa:
– Vai lá na mercearia e me traz o que tá nessa lista.
As meninas dormiam a sesta juntas, na mesma cama. Dali a um instante, mesmo que já fosse pelo meio do quarteirão, a empregada ouviu os gritos de dor, confusa com o estranho poema que estava escrito no papel em vez de uma lista de compras, enquanto a mulher-patroa, agarrada à própria filha, tentava lhe consolar:
– Foi preciso, minha filha, foi preciso...

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

CONVERSA COM FERNANDO LUCENA, O VEREADOR QUE SÓ LÊ OS COMUNISTAS - por Cellina Muniz e Jota Mombaça



Os três poderes
São um só:
O deles
Nicolas Behr


No dia 22 de janeiro, numa bela tarde, eis a novidade na rua Professor Zuza (aquela ali ao lado do IFRN da Cidade Alta, mais precisamente, onde fica o bar-restaurante de Zé Reeira): uma faixa na entrada da rua, tal qual porteira para o gado passar, anunciava: Espaço Cultural Dr. Rui Pereira dos Santos.
Nós e um grupo de amigos (o sebista-editor Abimael Silva, o professor João da Mata, o poeta Volonté e o pluriartista Falves Silva) discutíamos justamente o absurdo daquela “arrumação” quando o seu responsável, o vereador Fernando Lucena, irmão do finado Rui Pereira, apareceu por aquelas bandas, com aquele ethos de coronel que vai checar o seu curral. A propósito de rebanhos, naquele momento não havia nenhum militante do PT (talvez por conta do fechamento da sede, após o período eleitoral). Pois ele se aproximou, juntamente com o rapaz de nome Bruno, filho de Rui Pereira, a fim de saber o que achamos da novidade.
Quem pergunta quer saber, supõe-se, e então mandamos os questionamentos: qual o vínculo afetivo e simbólico o senhor Rui Pereira (cujo rosto já havia sido grafitado no muro do IF, não se sabe por que barganha) teve com aquele espaço da cidade? A escolha daquele nome foi fruto de uma consulta popular junto às pessoas que por ali moram, trabalham e/ou frequentam habitualmente ou foi simplesmente uma medida imposta goela abaixo? Há, efetivamente, representatividade e legitimidade naquela placa, além de sua cafonice visual?
Alguns esboços de resposta: não, ele não consultou ninguém porque ele é vereador e “representa” a cidade inteira; seu irmão Rui Pereira foi uma pessoa muito importante (segundo o filho Bruno, ele foi quem criou a FLIPIPA, viu, Dácio...) e “é meu irmão e eu quis homenageá-lo”. E acrescentou: “não deram o nome da ponte de Newton Navarro?”
Como se já não bastasse o assumido nepotismo e pretenso controle dos espaços culturais da cidade, o vereador ainda demonstrou sua ignorância acerca da literatura local, pois se tivesse lido “Do outro lado do rio, entre os morros”, obra na qual Navarro descreve o cotidiano na Redinha dos anos 70, ele entenderia a razão do nome, muito mais justo e legítimo do que aquele que ele quer impor à rua Professor Zuza (aliás, este sim um habitué daquele espaço, mais do que Rui Pereira foi).
Indagado se havia lido Navarro para pensar um pouco acerca das relações simbólicas entre um nome e um espaço da cidade, o vereador respondeu com essa pérola: “eu só leio os comunistas”. E só faltou dizer: “e apenas os livros de capa vermelha”. Não foi capaz de citar um só título de Gorki ou um verso de Maiakóvski...
Enfim, sem argumentos, desqualificou nosso grupo (nunca ouviu “tanta besteira”) e retirou-se, muito digno. A tarde seguiu e na mesa ao lado, uma outra polêmica se armava, certamente mais inteligente: quem jogou no Botafogo em 1972?
A pseudo-homenagem ao senhor Rui Pereira dos Santos (que, aliás, também não deve ter sido consultado) só reflete a mentira dos poderes constituídos supostamente democráticos para os quais, de novo e sempre, o público é apropriado em favor do privado.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

POR ONDE ANDARÁ ALICE N.?


Perguntei a todos, todos
(Aos profetas, rapsodos,
 
 
Aos suicidas e assassinos):
Saberiam do destino
 
 
Daquela que, mal surgida,
Fez-se desaparecida?
 
 
A que, por noite fugaz
Esteve, não está mais?
 
 
Poderão os adivinhos,
Os bebedores de vinho,
 
 
Dizer-me ao menos seu nome?
Será "A Mulher Que Some"?
 
 
Como o Silêncio me ouvisse,
Respondeu: "chama-se Alice.
 
 
Quer vê-la? Siga um conselho:
Procure-a através do espelho".
 
 (POETA DE MEIA-TIGELA)

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

13



O primeiro pseudo
poema em que me meto
neste ano 13,

não tem força

nem vigor,
alegria ou tristeza
no seu intento...
Beleza lhe falta
mesmo com toda dor,
Com todo o fogo no corpo,
e com toda a alma.
O primeiro pseudo
poema em que me meto
neste ano 13,
é como estrela que mal nasce
distante anos e anos-luz
para logo morrer
em espetáculo silencioso:
Ninguém sabe, ninguém vê.
Inútil
Esse poema em que me meto,
de novo,
outra vez...
Mesmo assim:
tento.