quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

CONVERSA COM FERNANDO LUCENA, O VEREADOR QUE SÓ LÊ OS COMUNISTAS - por Cellina Muniz e Jota Mombaça



Os três poderes
São um só:
O deles
Nicolas Behr


No dia 22 de janeiro, numa bela tarde, eis a novidade na rua Professor Zuza (aquela ali ao lado do IFRN da Cidade Alta, mais precisamente, onde fica o bar-restaurante de Zé Reeira): uma faixa na entrada da rua, tal qual porteira para o gado passar, anunciava: Espaço Cultural Dr. Rui Pereira dos Santos.
Nós e um grupo de amigos (o sebista-editor Abimael Silva, o professor João da Mata, o poeta Volonté e o pluriartista Falves Silva) discutíamos justamente o absurdo daquela “arrumação” quando o seu responsável, o vereador Fernando Lucena, irmão do finado Rui Pereira, apareceu por aquelas bandas, com aquele ethos de coronel que vai checar o seu curral. A propósito de rebanhos, naquele momento não havia nenhum militante do PT (talvez por conta do fechamento da sede, após o período eleitoral). Pois ele se aproximou, juntamente com o rapaz de nome Bruno, filho de Rui Pereira, a fim de saber o que achamos da novidade.
Quem pergunta quer saber, supõe-se, e então mandamos os questionamentos: qual o vínculo afetivo e simbólico o senhor Rui Pereira (cujo rosto já havia sido grafitado no muro do IF, não se sabe por que barganha) teve com aquele espaço da cidade? A escolha daquele nome foi fruto de uma consulta popular junto às pessoas que por ali moram, trabalham e/ou frequentam habitualmente ou foi simplesmente uma medida imposta goela abaixo? Há, efetivamente, representatividade e legitimidade naquela placa, além de sua cafonice visual?
Alguns esboços de resposta: não, ele não consultou ninguém porque ele é vereador e “representa” a cidade inteira; seu irmão Rui Pereira foi uma pessoa muito importante (segundo o filho Bruno, ele foi quem criou a FLIPIPA, viu, Dácio...) e “é meu irmão e eu quis homenageá-lo”. E acrescentou: “não deram o nome da ponte de Newton Navarro?”
Como se já não bastasse o assumido nepotismo e pretenso controle dos espaços culturais da cidade, o vereador ainda demonstrou sua ignorância acerca da literatura local, pois se tivesse lido “Do outro lado do rio, entre os morros”, obra na qual Navarro descreve o cotidiano na Redinha dos anos 70, ele entenderia a razão do nome, muito mais justo e legítimo do que aquele que ele quer impor à rua Professor Zuza (aliás, este sim um habitué daquele espaço, mais do que Rui Pereira foi).
Indagado se havia lido Navarro para pensar um pouco acerca das relações simbólicas entre um nome e um espaço da cidade, o vereador respondeu com essa pérola: “eu só leio os comunistas”. E só faltou dizer: “e apenas os livros de capa vermelha”. Não foi capaz de citar um só título de Gorki ou um verso de Maiakóvski...
Enfim, sem argumentos, desqualificou nosso grupo (nunca ouviu “tanta besteira”) e retirou-se, muito digno. A tarde seguiu e na mesa ao lado, uma outra polêmica se armava, certamente mais inteligente: quem jogou no Botafogo em 1972?
A pseudo-homenagem ao senhor Rui Pereira dos Santos (que, aliás, também não deve ter sido consultado) só reflete a mentira dos poderes constituídos supostamente democráticos para os quais, de novo e sempre, o público é apropriado em favor do privado.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

POR ONDE ANDARÁ ALICE N.?


Perguntei a todos, todos
(Aos profetas, rapsodos,
 
 
Aos suicidas e assassinos):
Saberiam do destino
 
 
Daquela que, mal surgida,
Fez-se desaparecida?
 
 
A que, por noite fugaz
Esteve, não está mais?
 
 
Poderão os adivinhos,
Os bebedores de vinho,
 
 
Dizer-me ao menos seu nome?
Será "A Mulher Que Some"?
 
 
Como o Silêncio me ouvisse,
Respondeu: "chama-se Alice.
 
 
Quer vê-la? Siga um conselho:
Procure-a através do espelho".
 
 (POETA DE MEIA-TIGELA)

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

13



O primeiro pseudo
poema em que me meto
neste ano 13,

não tem força

nem vigor,
alegria ou tristeza
no seu intento...
Beleza lhe falta
mesmo com toda dor,
Com todo o fogo no corpo,
e com toda a alma.
O primeiro pseudo
poema em que me meto
neste ano 13,
é como estrela que mal nasce
distante anos e anos-luz
para logo morrer
em espetáculo silencioso:
Ninguém sabe, ninguém vê.
Inútil
Esse poema em que me meto,
de novo,
outra vez...
Mesmo assim:
tento.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

ÚLTIMAS RIMAS CHINFRAS DE 2012

FIM DE ANO,
FIM DE MUNDO
EU DE NOVO
SEM RUMO.

2.
O DOLAR,
O DIA,
A DOR...
VIDA, VIDA
QUE ROLA,
ROLARIA,
ROLOU...

3.
DEZEMBRO CHEGOU!
DE NOVO O ANO
FINDOU!

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

POEMETOS EM QUE ME METO

1.

O FIM ESTÁ PREVISTO.
MESMO ASSIM
INSISTO.

2.

A QUALQUER DIA,
EM QUALQUER LUGAR,
UM ACASO QUALQUER.


3.

EI, PODE IR EMBORA:
DEIXE ABERTA A PORTA
QUE EU TAMBÉM VOU.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

MAIS UM CONTINHO ORDINÁRIO


EM MEIO À BRUMA E SOLIDÃO

-   Dona Fransquinha, é aqui, ó, aqui que senta...
Mas Fransquinha queria sentar para cagar era no jarro da pequena palmeira que havia no banheiro, ao contrário do vaso sanitário muito branco e limpo que a cuidadora Armanda mostrava para ela. Certamente, no sábio esquecimento da doença, concluía que pouca diferença faria – era tudo sempre a mesma merda.
- Aqui, dona Fransquinha, vem...
Desistiu de teimar e foi pro trono. O clássico. Em alguns anos mais, dona Fransquinha não controlaria os movimentos do esfíncter e usaria fralda descartável. Bem diferente de seus primeiros cueiros, de oitenta anos atrás.
Fransquinha, um dia, foi menina e foi mulher. Menina, já teimosa e cheia de manha. Mulher, cheia de tara e ardil. Onde vagavam as lembranças de dona Fransquinha naquele momento em que defecava sem se notar?
E quando começou o fim?
Não sabia, não lembrava. Da noite para o dia perdeu toda compostura. Dizia o que queria. A cada mês mudavam de cuidador ou enfermeiro, exaustos com os desaforos de dona Fransquinha:
- Olha, amanhã eu venho almoçar com a senhora de novo, viu?
- E por que você não vai encher esse rabo em outro lugar?
Era tudo bruma na mente de dona Fransquinha. Mas numa daquelas noites, depois de um ataque furioso de gritos e pratos no chão, quando todos na casa dormiam, exaustos, e só a solidão espreitava, acordou com a lembrança que veio súbita em forma de sonho.
...
Ela me arrastava pela mão, como quem leva cruz. Mas, na verdade, ela é que era minha cruz. Me arrastando, de bar em bar, esmolando um trocado, se fingindo desempregada. Era tanta a minha infelicidade que minha cara de dor convencia e muitas vezes recebíamos uma esmola gorda.
Era nos fins de semana. No sábado e no domingo, logo cedo, a velha vinha com sua voz esganiçada, infalivelmente:
- Ainda não tá pronta, Fransquinha? Anda logo, troço!
Embora com doze anos, eu tinha que vestir uns vestidos que me infantilizassem, havia dois ou três para aquela ocasião, muito puídos, que era para despertar ainda mais nossa triste condição de pedinte.
O fato é que a desgraçada possuía duas casas, cujo aluguel dava perfeitamente para nos sustentar. Como era mesmo o nome da bruxa? Por onde ela estaria agora?
Nos quinto dos infernos, é claro!
...
E aquela certeza lhe pareceu incrivelmente engraçada. Nos quintos dos infernos, claro!
E pôs-se a gargalhar com gosto, vingada daqueles anos de miséria que o tempo apagou da memória.
- É nos quintos dos infernos, nos quintos dos infernos, claro!
Gargalhava tão alto, dona Fransquinha, que as luzes na casa se acenderam. E riu tanto que se cagou na roupa.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

IMPRESSÕES PRESENTES E PONTUAIS SOBRE HOMENS...

Alice N. pegou sua mochila e se mandou para um evento literário no litoral sul. Foi curtir uma zona libertária temporária. Tomou banho de mar, jogou seu fanzine entre os convivas, ouviu conversas sobre livros, encheu a cara... Na volta, acumulou algumas impressões.
Dentre elas, impressões sobre homens. Ou alguns exemplares dessa estranha raça.




Primeiramente, a raça dos ex-maridos. Se tem uma coisinha pior que marido, certamente é a de ex-marido. Ele chega para ficar dois ou três dias com os filhos e quando você volta encontra a casa uma zona, o computador desconfigurado e as plantas (que você implorou para serem regadas) amareladas e secas de sede. E você que lave a louça que ele sujou e compre o café que ele bebeu todo. Estranha a mania de se comportar ainda como se a mulher (pior, a ex-mulher) fosse a mamãezinha. Realmente, não dá para não concordar com aquela atriz: cuecas, agora, apenas sobre as cadeiras, nunca mais no guarda-roupa...

Segunda espécie: aqueles que saíram de um relacionamento recentemente e se esforçam quase histericamente para entrar de cabeça em outro. E pior: é com você! Em vez de pegar leve, sem desespero, faz questão de grudar e de não dar um minuto para sua solidão. E se você foge, por uns momentos, faz logo um muchocho e te esnoba na primeira oportunidade. Versão humana (?) e masculina do bichinho carente. Nada contra ser um maior abandonado mas sem coitadismos, né...

Terceira espécie: o hipócrita egoísta. Exige sem dar. Cobra sem retribuir. Só sabe dividir, nunca quer somar. O extremo oposto do anterior, finge ciúme mas o que sente mesmo é vaidade, porque acha que o mundo gira ao seu redor e que todos os sentimentos devem estar voltados exclusivamente para ele. Em outras palavras: um mané arrogante e babaca.

Alice N., pensando nesses casos, não tem dúvida: a certas companhias masculinas, melhor mesmo é ler um livro e tomar banho de mar.