sexta-feira, 3 de agosto de 2012

MAIS UM CONTINHO ORDINÁRIO - Mais uma crônica de mais um amor louco



MAIS UMA CRÔNICA DE MAIS UM AMOR LOUCO

Ele ali. Depois de esperar uma hora e dezessete minutos, olha ele ali. Daquele jeito mesmo que imaginou: simpático, discreto, casual.
Junto a outras três ou quatro pessoas que assistiram à conferência, entrou na sala VIP. Pessoas do staff entravam e saíam. Umas maçãs sobre a bandeja na mesa. Ele foi logo sorrindo:
- E aí pessoal...
Fotografias, sorrisinhos, satisfação. Ela permaneceu meio à parte, balançando a cabeça feito boi que concorda com o enredo que a conversa vai tomando. Sim, é, com certeza... Ele olhava para o grupo de uma maneira geral, como quem vê apenas o rebanho. Por dentro do casaco, ela sentia o frio da lâmina. E perguntava-se, como assim, pois é? É tudo o que você tem a me dizer depois de treze livros, cinco álbuns com trezentas e quinze fotos e reportagens, dias sem comer e noites sem dormir?
Na verdade, no íntimo, ela já sabia. Sempre soube. Esse daí é um feladaputa. Também. E já via toda a cena. Os dois juntos na cozinha, nus, tomando cerveja e dançando ao som de Manga Rosa, para depois ele ir seduzir colegiais com dois ou três versos razoáveis, enquanto a esposa o esperava em casa para o jantar. O problema é que o desgraçado não era só medíocre. Escrevia ótimos livros. E ela, jumenta, insistia que não via, insistia naquela condição – ser sua fã.
Foi assim: um dia, casualmente, depois do trabalho (ela, na época, já era caixa numa rede de farmácias), saiu para a noite que se iniciava sem maiores planos. Talvez um sorvete na esquina antes de ir para casa. Foi culpa da Ritinha, que não quis ir ao shopping com ela, estava gripada. Se tivessem ido circular feito baratas tontas, olhando as vitrines sem poder comprar porra nenhuma, não teria parado na banca de jornal da parada de ônibus, não folhearia revistas de previsão astral, não esbarraria no livro de bolso que anunciava – MAIS UMA CRÔNICA DE MAIS UM AMOR LOUCO, de Jorge Jota Jameson. Na capa, ela viu o seu próprio retrato – uma mulher de cabelos longos e loiros, sendo arrebatada num beijo de intensa paixão por um lindo e gentil cavalheiro...
Ali começou seu céu, seu purgatório, seu inferno. Não perdia um, mal saía o livro, já procurava no dia seguinte pelas bancas mais próximas. O rapaz da banca da esquina, o José, volta e meia soltava uma piadinha sem graça – esse cara deve ser bom, hein? Ela olhava furibunda de ódio para o moço, que cara o quê, animal, pensava e o outro baixava os olhos, constrangido com o olhar de fúria da fã. E meses depois, quando ela passava em frente à banca, ele costumava gritar, tentando ser simpático, coisas do tipo “Madame Maverick não mora mais aqui” chega na próxima semana, eu sei, ela resmungava entre dentes. Hunf.
Tablóide, revista de fofoca, blogs de internet, ela não perdia nenhuma novidade, nenhuma notícia, nada. Jota Jameson separou-se. Jota Jameson reatou com a esposa. Jota Jameson brincando com os cães de estimação na praia de Búzios. Jota Jameson fazendo a campanha de abertura do Criança Esperança. Ai, Jota Jameson!
Até que um dia leu, na revista: REVELADO TUDO SOBRE OS CASOS SECRETOS DE JORGE JOTA JAMESON. Ela ficou aturdida, não podia acreditar, não podia ser verdade que Jota Jameson levava fãs para a cama. Levava sim. Várias delas abriram a boca, aos prantos. Ele recita versos, ele nos deixa frágeis, ele nos leva para jantar num hotel caro, ele desaparece.
Seu mundo caiu. A essa bomba, seguiram-se outras revelações bombásticas, estampadas nas revistas de dois reais e cinquenta centavos: JOTA JAMESON ACUSADO DE PLÁGIO. JOTA JAMESON VAI AO TRIBUNAL PRESTAR CONTAS POR COPIAR ESTÓRIAS DE OUTROS AUTORES.
Não podia ser verdade. Ela tentava crer no que ele gritava nas capas seguintes: ESTÃO ME PERSEGUINDO! Mas alguma coisa desfalecia dentro de si. Todas aquelas lindas cenas imaginadas eram então mentira? Todas aquelas palavras que a embalaram nos ônibus lotados e nas filas de banco eram pura lorota?
Quis morrer, queimar pôster, livros e todos os arquivos que fizera ao longo dos últimos anos, quis morrer, quis matar. E sentia-se as próprias personagens dos livros do cretino, como Marialva da Cruz, de OS MISTÉRIOS DO AMOR, ou mesmo a Dra. Martine Follmaw, de SERÁ QUE ELE VOLTA?, banhada em lágrimas de desespero e desilusão. Ô vida cruel, meu Deus, essa de fã, essa de mulher...
E nada a tirava daquela tristeza, nem mesmo a campanha maciça da mídia por recuperar a imagem de bom moço de Jota Jameson: ele doando sangue, ele assinando um contrato em que cedia parte de seus direitos autorais para uma instituição que cuidava de papagaios com câncer, ele malhando na academia pelo dia mundial da saúde. Não, Jota Jameson, não dá mais. Não acredito mais em você, ela suspirava, cheia de ressentimento, pensando em como aquelas meninas das denúncias eram bonitinhas...
E foi então que chegou o dia em que Jota Jameson veio à cidade. Ele fazia uma turnê pelas principais capitais para o lançamento e divulgação de seu mais recente livro – SOBREVIVEREI, SIM! Mais de cinquenta mil cópias vendidas, só na primeira quinzena.
Ela leu a notícia na revista ASTRAL LEGAL sem esboçar nenhum gesto, nenhuma reação. Ele vem aqui, apenas pensou. E pensou nas meninas banhadas em lágrimas, ele jurou me amar, diziam, ele prometeu que era amor à primeira vista, gemiam, ai, Jota Jameson, isso não se faz.
Chegou o dia. Ela foi trabalhar normalmente. Atendeu os clientes da farmácia com a indiferença de sempre, mesmo que não tivesse dormido nada. Teve uma noite de cão, rolou na cama várias horas, sem conseguir dormir. E de manhã cedo, quando se levantou, foi direto para a cozinha e pegou a faca mais afiada que havia na gaveta.
Ali estavam, pois, os dois: autor e leitora. Ele com seu sorriso impecável e suas histórias de sempre. Ela afagava a lâmina, pensando em como fazer. Como fazer, meu Deus? Ela suava, o coração acelerado, o choro se anunciando...
Sem pensar, sem dizer nada, deu meia volta e saiu correndo, fugiu dali histericamente. Correu algumas quadras, feito louca, até que parou, sentou num banco de praça e pôs-se a derreter em um choro convulsivo.
- Ei, você...
Ouviu uma voz gentil dizer.
- O que foi que aconteceu? – alguém lhe afagava os cabelos, suavemente, sentando-se ao seu lado. Sentiu um cheiro delicado invadir suas narinas, com aquele toque.
Ele passava por ali coincidentemente. José, o cara da banca.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

POEMA SEM TÍTULO, DE CARITO

Já busquei meu interior
E ele estava no além-mato
Já fiz poesia concreta
Já fiz poesia com Crato.

terça-feira, 24 de julho de 2012

POEMETOS EM QUE ME METO

Poeminha para a tarde


Em que se precisa a precisão?
Equilibrista sobre a corda dúbia,
Por que não cai você?
Quem há de saber?
Quem sabe o segredo do sol brilhar assim tanto?
Por que a gente se quebra de rir e de pranto?
Por que querer reter no instante
o tempo no todo seu
Infinitamente
Longo
Manto?

quinta-feira, 19 de julho de 2012

domingo, 15 de julho de 2012

NA CHAPADA DO ARARIPE


MAIS UM CONTINHO ORDINÁRIO


PRECISA-SE
Chamava-se Osvaldo. Um cara comum. Cinquenta e seis anos, funcionário público municipal, signo de virgem, torcedor do Fluminense. Acima do peso. Separado duas vezes. Sem filhos, sem seguro de vida, sem maiores planos.
Durante a semana, após o expediente, no começo da tarde, passava inexoravelmente no bar de seu Dodô, onde tomava duas ou três doses com um caldo de feijão preto. Conversava com os colegas, habitués do bar como ele, lia o jornal, rabiscava algumas anotações na agenda.
Perto das cinco da tarde, dirigia-se para o ponto de ônibus na avenida ali perto, pegava o 48 e chegava a sua casa a tempo de tomar um banho, preparar um sanduíche de mortadela e assistir à novela.
Acordava às seis e quinze da manhã, com o rádio anunciando as primeiras notícias do dia. Fuga no presídio estadual, greve dos bancários, acidente de carro na zona norte com três mortes, corrupção no senado nacional.
Fazia a barba, como todas as manhãs, aparando cuidadosamente o bigodinho fino. Vestia a camisa de botão que Alzira, a mulher que vinha duas vezes por semana para limpar, lavar e passar, deixara cuidadosamente no guarda-roupa. Passava uma gota de água de cheiro no pescoço e ia tomar um café preto com tapioca no Seu Pedro da esquina.
Antes das oito chegava ao trabalho. Cumprimentava o porteiro, batia o ponto no relógio de ponto, bebia um copo d´água no seu copo reservado no refeitório, sentava à sua mesa de trabalho com um pequeno suspiro. Mais uns anos e se aposentaria.
Pra quê?
Na hora do almoço, ia com alguns colegas do trabalho no self-service de sempre. Comia bife com batatas, como sempre. Assistia um pouco ao noticiário da TV, como sempre. Pendurava a conta para pagar no começo do próximo mês.
Voltava para a repartição, cumpria mais algumas demandas e logo mais saía. Batia o ponto no relógio de ponto, despedia-se do porteiro e ganhava a rua, cheia de gente, automóveis, árvores, informações.
Pois naquela quarta-feira de setembro, Osvaldo deteve-se, em dado momento de seu caminho rumo ao bar de seu Dodô, diante de uma daquelas informações. Na janela de uma casa onde parecia funcionar algum comércio, leu numa placa escrita à mão:
PRECIZA-SE DE UM AMOR
Ficou parado, olhando a placa, ligeiramente confuso, como quem não sabe o que deve fazer. Olhou para a casa, contemplando sua fachada meio antiga. Portas fechadas. Afinal, pôs-se novamente em marcha e seguiu para suas duas doses e seu caldo de feijão preto, distante dali a uns três quarteirões.
No dia seguinte, já ao sair da repartição, Osvaldo lembrou-se da placa e sentiu aumentar a curiosidade. Estava lá, no mesmo canto, na casa de número 33, o mesmo aviso:
PRECIZA-SE DE UM AMOR
Novamente parou e contemplou por um instante a placa, um pouco desconfiado, olhando ao redor. Ainda tentou mostrá-la para um dos transeuntes que seguiam pela mesma calçada;
- Olha só que coisa...
Mas o homem que passava não lhe deu a menor atenção, seguindo para o seu destino desconhecido. Viu que as portas continuavam fechadas e, meio frustrado, foi embora.
No dia seguinte, sexta-feira, ao despertar do rádio, ainda na cama, Osvaldo decidiu desvendar aquele pequeno mistério. E, ao final do serviço, bateu o ponto apressado, como também se despediu apressadamente do porteiro, ganhando a rua quase às carreiras. Chegou diante do número 33 e viu, novamente, a placa com o mesmo aviso:
PRECIZA-SE DE UM AMOR
Percebeu, então, as portas abertas. Lá dentro, uma sala branca, limpa, com um ventilador de teto, um birô e três cadeiras encostadas junto à parede. Na mesa, folheando uma revista, uma jovem mulher.
Um tanto constrangido, Osvaldo decidiu-se e subiu os três pequenos degraus, entrando na sala. Não fazia a menor ideia do que funcionava ali e mal se atreveu a gaguejar:
- Dá licença, moça... Essa placa, aqui fora...
A mulher mal ergueu a cabeça da revista, olhou para ele e, após um rápido instante, deu um profundo suspiro. Apenas declarou:
- Acho que não se aplica...
- Desculpe, não entendi...
- Não se aplica ao senhor. Sinto muito.
Osvaldo ficou ali parado, rente à porta, olhando a mulher. Ela não era nem bonita nem feia. Tinha um que de tristeza no olhar. Permaneceu calada, observando Osvaldo, que não sabia o que dizer. Afinal, ele saiu daquele torpor:
- Eu sei, minha filha, só vim dizer que está escrito errado.
E virou-se num rompante, dando as costas para a jovem e retirando-se dali para sempre. 
Foi para o bar de seu Dodô, onde bebeu suas duas doses e tomou seu caldo de feijão preto. Ao final da tarde, pegou o ônibus 48 e foi para casa.
À noite, depois do banho, do sanduíche de mortadela e do capítulo da novela, deitou-se em sua cama para dormir e chorou de tanta solidão.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

RELANÇAMENTO DO LIVRO DE CONTOS DE ALICE N.



AGORA EM FORTALEZA!!!
RELANÇAMENTO D´O LIVRO DE CONTOS DE ALICE N.
NO ESPAÇO-CASA (RUA ADOLFO HEBSTER, 76 - BENFICA)
A PARTIR DE 17H
NA DISCOTECAGEM DE TOMÉ BRAGA E COM LEITURAS DRAMÁTICAS DE CHICÃO OLIVEIRA E EUGENIA SIEBRA.