segunda-feira, 30 de maio de 2011

Condenados à liberdade, como viver a tarde?

Estarei me tornando uma cínica? Ou já me tornei faz tempo?
Hoje, por exemplo, comi carne de porco e pensei - dane-se. Atravessei a rua fora da faixa, joguei um papel de bala no chão, virei a cara diante do crente que me disse "Jesus te ama" e pensei - dane-se.
E quando a lua nova vai se aproximando, aí é que dou de ombros para tudo e todos. Inclusive para a possibilidade de um dia ter que contar com alguém que não me dê de ombros.
Cadê uma causa para abraçar? Cadê Exupery e não Sade? Cadê um amor incondicional para se viver? Cadê a Esperança para me cegar com os raios de luz que escapam do baú?
Mas essas questões nem me ocorrem porque estou mais ocupada em tentar me lembrar onde foi mesmo que deixei os cigarros e o isqueiro. E mesmo sendo plena a tarde.
Acho que estou me tornando uma cínica.

domingo, 29 de maio de 2011

NA CABEÇA ATIVA: MARCHA DA MACONHA EM NATAL - 2011


A Cannabis produz um amplo espectro de efeitos perceptivos. Entre eles estão mudanças de humor, facilitação do comportamento interpessoal e redução do comportamento agressivo. Em outras palavras, a Cannabis em geral faz as pessoas se sentirem felizes, sociáveis e tranqüilas. Os sentidos do paladar, olfato, toque e audição ganham novas qualidades e maior intensidade. O sentido do tempo é invariavelmente distorcido pela Cannabis; os eventos parecem durar muito mais do que realmente duram. Outro efeito comum é um forte sentimento de estar "aqui-e-eagora".


(ROBINSON, Rowan. O grande livro da Cannabis: guia completo de seu uso industrial, medicinal e ambiental. Tradução de Maria Luíza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1999.)

NO ATELIÊ DO ARTISTA

Ali pelas proximidades do Beco da Lama, reduto de artistas, intelectuais, boêmios e desvalidos da Natal cidade, o Sr. Ângelus, mais conhecido como Jotó, reúne amigos e admiradores, fazedores ou fãs de Arte.
A capital potiguar agradece sua presença, bem como os que por essas bandas chegam. Viva Jotó!

 No ateliê de Jotó, Fábio Eduardo nos apresenta a sua arte.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

DA MUSA

Ela busca o poeta
A quem há de ouvir.
Em que palavra,
Em que verso,
Esconde-se ele assim?
Procura a musa o poeta,
Que lhe diga sim.
Na estrofe,
No gesto,
Na rima ruim.
A musa procura,
Soprando a poesia
Que não cabe em si.

domingo, 22 de maio de 2011

Potiguar a ferro e fogo

E como a vida é trágica
e eu adoro um drama
aí vai um poeminha
de se ler na cama:


Agora sim sou potiguar:
Já degusto cabeça de camarão
E com que gosto!
Mas não dura nada,
ai, desgosto,
essa paixão.

Sábado é dia de ir ao Sebo!

Sabe aquele livro, daquela edição esgotada há anos? E aquele vinil, com aquele chiadinho gostoso, que há tempos você não ouvia? Sabe aquela conversa fiada que dá gosto? Se não sabe, vá a um Sebo!
Salve o Sebo Zahir! Salve todos os sebistas!
                                                                          Uma delícia de Sebo
                                                  Mil e uma elocubrações lítero-etílicas
                                                 Alice N. se deslumbra no Sebo de Vicente

Sábado no Sebo

Nada como um sábado num sebo... O Sebo Zahir, em Parnamirim, é uma delícia: ótimos vinis, ótimos livros, ótimas companhias e ótima acolhida do anfitrião Vicente.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

MAIS UM POEMINHA ORDINÁRIO

Restos de mim
dispersos por aí
estou a procurar...
A qualquer um pergunto:
você viu?
viu você?
Nem não, nem sim
nem lá, nem aqui
procuro sem encontrar
esse resto,
esse troço,
esse avesso que no gesto
de me saudar, tão gentil,
me sorri, sincero,
pleno,
inteiro:
Um só ser.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

DO FLÂNEUR

Já vejo o poeta, bêbado, seguindo meio trôpego pelas ruas, não se sabe para onde. Depois de errar de bar em bar, ao avançar da noite, também ele avança por entre as ruas e avenidas, um verso a lhe escapar da mente-memória, uma musa a lhe soprar no coração-paixão, vai ele seguindo, anjo nem tão veloz, mas efêmero em meio a gentes, lojas, automóveis, semáforos que dizem sim e não, sim e não, sim e não ao longo da antiga rua da Aurora...

domingo, 15 de maio de 2011

Nas águas do Potengi

UM CONTINHO SUJO

SOB AS BÊNÇÃOS DE DEUS
– Bença, mãe...
Os filhos vinham em fila, cumprir o rito sagrado de todas as noites. Doze, sete e cinco anos. Cada um de um pai diferente, perdido no mapa e na memória de Zilda. Porque isso não tinha a menor utilidade e importância. Importante era poder beijar a cabeça de cada um, desejando bons sonhos e uma vida feliz no futuro. Isso é que era importante para Zilda, sentia, enquanto, na rua vazia, esperava o último transporte a caminho da cidade.
Ali, sozinha no ponto de ônibus, Zilda se desfazia, transitoriamente e aos poucos, do papel de mãe. Só pensava em uma coisa: dar. Os brincos balouçantes, o batom vermelho e a saia curta confirmavam. E daria, sim, a Zilda. Feito louca, feito animal, num balé bestial de corpos estranhos, desejantes e vorazes.
De manhã, exausta, Zilda voltava para casa no primeiro ônibus. O céu ainda escuro e uma sensação que não era nem de alegria e nem de tristeza, um sentimento trágico. A existência, pura e simples, era o que Zilda sentia, sem floreios de breves esperanças, sem mesquinharias de culpa ou auto-comiseração.
Mas isso não era rotina para Zilda. Embora regular. Às vezes ficava coisa de três meses sem aparecer no Lux Dance. Ia assim, quando tinha vontade. Ou, raramente, porque ficava apertada demais e as faxinas não cobriam os gastos. Ia mesmo era por vontade. E vontade, para Zilda, era aquela coisa enervante, peito pra explodir pela boca, pé que não pára quieto, mão que não tem lugar. Mente que só pensa numa mesma e sempre coisa: um pau. Uma pica grossa e dura para idolatrar. Ficava dois ou três dias pensando, pensando. Varrendo o quintal, esfregando a farda dos meninos, no pé do fogão, sempre o mesmo pensamento. Então ia até o orelhão e ligava para o Zé.
– Hoje eu vou. Avisa pras meninas.
Nem precisava mais fazer isso porque já rodava por lá há mais de dois anos. Mas sempre avisava que ia para fazer ponto, atrás de cliente. Uma free-lancer. Só pra inteirar o aluguel do mês ou o remédio pro verme do menino, mentia. Avisava porque quando chegou lá, na primeira noite, mesmo já conhecendo o Zé, a Verinha fez cara feia e quis criar confusão. A Verinha era a Loira Marombeira: não valia a pena encarar.
E não queria briga: queria amar. Beber, fumar, flertar, dançar e foder. Apaixonadíssima, diria palavras doces. Furiosa, enxovalharia o outro de xingamentos. O cheiro e a língua do outro derrubavam Zilda num abismo de desmesura. Então, entre a ternura e o desespero, Zilda alcançava o coração do mundo e gozava.
De volta para casa, chegava a tempo de dizer para cada uma das três cabeças sonolentas, no ritual matinal:
– Deus te abençoe, meu filho.

NA REDE COM NEI

Outras leituras: "Rua da Estrela". Alguns trechos impagáveis, que, ao lê-los, se sente que é o que se queria escrever... Um rápido exemplo:
"Onde se oculta o amor oculto? Nas franjas do mar? Na cortina dos cabelos? (...) O amor oculto percorre caminhos, trilhas, ama a natureza e é livre, solto, felino como uma tigreza".

ENTRE

EU QUERIA TER UMA BOMBA!!!

E se meu mundo ninguém vê e em meu sonho ninguém crê, o que consola é que depois de um sábado chuvoso, sempre vem um domingo tímido de sol...

UM FERIADO

Quando a viu, viu primeiro sua boca. Boca de lábios finos, quase nervosos. Fumando o cigarro se tornavam mais ríspidos. Lábios de Rita, a ríspida.
O quarto era um cafofo. Uma maloca velha, desejada de ninguém. Tinha a percepção completa daquela realidade. Olhava cada canto, cada viga, cada mancha, ofegante ainda da caçada, e constatava – bom demais para durar. Era como uma trégua, bananas e maçãs maduras em plena trincheira de guerra. Era como uma ilha, manancial de água doce e sombra de coqueirais em meio à vastidão salgada e imperdoável do oceano. Rita, naquele quarto minúsculo, escuro e fétido, era um lenço branco no amontoado de roupa suja e mofada. Um lenço com bordas de renda, cheirinho doce de alecrim e lembranças perdidas de infância feliz.
Rita: um cigarro nos lábios finos e vermelhos, olhar perdido de mulher perdida. Tá olhando o quê, otário? Rita, a ríspida. Ficou calado, sem ter o que dizer. Minutos depois, desistiu do café e pediu uma dose, no botequim. Sabe de uma coisa, pensou, hoje vai ser feriado. Mais animado, perguntou, quase doce, aceita uma dose? Óbvio! ela exclamou, rispidamente. Assim era Rita. Rita de Cássia. É, nome cafona, eu sei, ela disse, quando se apresentou. Mas no nome não cabe a pessoa, ele disse. E ela gostou. Mais outra dose, então.
Depois foram ver o mar, encharcados de cachaça e de vontade. Era uma louca, a Rita. E os lábios eram uma delícia, como seus cabelos cacheados e seu olhar de fúria. Como já adivinhava, ao vê-la entrar no boteco, fatigada de mais uma noite de lida. O que você faz? perguntou, só para testá-la, sem coragem de olhar nos olhos dela. Eu sou puta, declarou, devorando o último naco de carne do espetinho de um outro botequim. Caía a noite. A melhor hora do dia. Hora de fazer planos, de se permitir sonhar. Vixe! ele não conseguiu segurar. Ela o encarou, com firmeza. E você faz o que, maioral? Eu? Sou operador de xerox, mentiu. Ah, é? Trabalho numa biblioteca, oito horas cercado de livros e revistas, no mezanino. Ah, é? E que porra é mezanino? Mezanino? É, que porra é essa? É o piso em que trabalho. Fica no vão de uma escada. Ah, é? Então me diz uma coisa, quando alguém sobe a escada, e você sente que tem alguém por cima de você, você goza? Ele riu, quase engasgando com a cebola da farofa. Pois é, eu pelo menos consigo, de vez em quando, explicou Rita, a ríspida.
A melhor de todas, ele já sabia, olhando para ela enquanto seguiam no ônibus. Mil vezes melhor que Lívia, a lívida. Ou Malena, a maligna. Amaria Rita por mil anos, concluiu. Mas era bom demais para durar, soube, com o rosto mergulhado no sexo salgado de mar, um portal de luz naquele quarto sombrio onde ela morava. O melhor lugar do mundo.
As primeiras réstias de luz se adiantavam, tímidas, quando Rita dormiu. Dormia candidamente, e não tinha nada de ríspida, com seus traços suaves, suas linhas perfeitas. Nada ríspida, depois de uma caçada tão furiosa. Um sossego aquilo ali. Uma paz que mezanino de biblioteca nenhum daria. Amaria Rita por mil anos.
Catou as peças de roupa espalhadas pelo chão. Um gato surgiu do escuro, observando sua fuga. E fugiu, girando a chave com cuidado, abrindo a porta, escapando madrugada afora, porque aquilo ali era bom demais para durar.

sábado, 14 de maio de 2011

POEMETOS EM QUE ME METO

Devir

Que venha o novo
Que vença o outro
Que eu seja sonho
De prata, bronze
E ouro.
Que eu faça arder
Feito fogo
Intenso, febril,
Louco.

MURILO RUBIÃO

Nova leitura que, no momento presente, ataca, dilacera e consola: Murilo Rubião. O conto A Fila, especialmente, foi direto ao coração.

Batizado

Enfim, após alguns meses errando, pagã, na nova vida-cidade, eis que me batizo: cruzo o Potengi de barco! No dia 13 de maio de 2011, na tarde solitária, eu me libertei de mim mesma e nasci de novo.